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Governo moçambicano tem "medo de uma Primavera Árabe"

 


Analistas dizem que uso excessivo da força pela polícia moçambicana, este sábado, reflete o falhanço das políticas da FRELIMO e pode fazer aumentar a revolta popular. Oposição diz que sucedido pode ferir presença na ONU.

A violência usada, este sábado (18.03), pela polícia moçambicana para travar as marchas organizadas em homenagem ao 'rapper' Azagaia mostram que a FRELIMO, partido no poder, tem "medo de uma Primavera Árabe" no país. 

O Governo da Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO) "tem medo que aqueles movimentos lá de cima, que aconteceram no Magrebe, possam descer para esta zona subsaariana", afirmou, esta manhã à Lusa, João Feijó, investigador do Observatório do Meio Rural (OMR).

O também sociólogo defendeu que as várias crises que Moçambique atravessa provocam uma "desconfiança profunda" nas autoridades, levando-as a "negar por completo direitos constitucionais de participação [política], de livre expressão e de liberdade de reunião".

"Tiques fascistas"

A atuação da polícia, prosseguiu, reproduz um contexto "sinistro", com "tiques fascistas do tempo colonial", contra os quais a FRELIMO usou a luta armada.  

"A FRELIMO constituiu um movimento de jovens que encontraram na violência a única forma possível de participação [na resolução dos problemas do país], eles foram empurrados para a violência pelo Governo colonial", enfatizou, tentando expor as contradições do partido no poder, ao repetir os erros do sistema colonial português no tratamento às reivindicações das antigas colónias. 

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Polícia moçambicana reprimiu, este sábado, com gás lacrimogéneo marcha de homenagem a Azagaia em MaputoFoto: Da Silva Romeu/DW

Também Régio Conrado, docente de Ciência Política na Universidade Eduardo Mondlane (UEM), considera que a sistemática repressão de manifestações populares por parte da polícia traduz a consciência que o Governo tem do falhanço das suas políticas e do acentuado descontentamento social.

"Quando um determinado regime atinge este nível de podridão, de incompetência e de ineficiência, obviamente, que o que lhe resta à sua disposição é o uso excessivo da força", enfatizou Conrado.

Para "a sua própria sobrevivência" perante o desgaste da imagem, continuou, o Governo da Frelimo recorre ao "uso excessivo da força".

Destacando que as marchas convocadas em memória de Azagaia eram pacíficas, o académico salientou que a violência policial só vai intensificar a revolta popular e aumentar "a agonia do regime".

"É um Governo fraco"

O diretor da ONG Centro de Integridade Pública (CIP), Edson Cortez, referiu que o atual Governo está a mostrar que é o "mais fraco da história de Moçambique e recorre à violência para travar o exercício das liberdades fundamentais".

"É um Governo fraco, os governos fracos aumentam a força da repressão e este é o Governo mais fraco que Moçambique já teve em toda a sua história", frisou Cortez.

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Ação policial está a ser severamente criticadaFoto: Da Silva Romeu/DW

Para o diretor do CIP, o Governo da Frelimo é hostil ao pensamento diferente, mas permite manifestações e marchas de apoio ao partido no poder.

"Para proteger o cidadão, [a nossa polícia] nunca lá está, sempre é das entidades públicas menos credíveis", frisou.

A polícia moçambicana não respeita a lei e está sempre associada a atividades criminosas, incluindo raptos", destacou.

Presença na ONU

Reagindo também aos acontecimentos desta manhã, Lutero Simango, presidente do Movimento Democrático de Moçambique (MDM), questiona: "Que presidência [do Conselho de Segurança] estamos a demonstrar com esta violação dos direitos humanos?".

O líder daquele partido da oposição falava aos jornalistas nas ruas de Maputo, à margem da ação policial, e questionou qual a imagem que o país transmite ao violar "os princípios básicos da paz".

"Nós, moçambicanos, queremos a paz", realçou.

Azagaia

Vítor da Fonseca, comissário dos Direitos Humanos da Ordem dos Advogados de Moçambique, também nas ruas da capital, criticou igualmente a ação da polícia.

"Moçambique ficou membro não-permanente do Conselho de Segurança das Nações Unidas e está a violar a segurança" no seu próprio solo, referiu.

"Parece que estamos numa ditadura"

Aquele responsável perguntou até se "virão sanções", face ao que considerou ser um uso excessivo da força.

"Este povo não tem nenhuma pedra, nenhum instrumento, só a boca a dizer: 'povo no poder'", referiu, numa alusão a um dos temas mais conhecidos do 'rapper' Azagaia e cujo título foi hoje repetido nas ruas da capital.

"Parece que estamos numa ditadura, não num Estado de direito democrático", disse, considerando que os acontecimentos de hoje "vão contra o que a Constituição da República preconiza no artigo 51, quando fala do direito a reunião e manifestação".

"O Estado está sendo ofuscado por algumas pessoas que não querem o Estado de direito democrático", concluiu.

Moçambique assumiu em janeiro o mandato de membro não-permanente do Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas (ONU) para o período de 2023 e 2024. Este órgão, criado para manter a paz e a segurança internacionais em conformidade com os princípios das Nações Unidas, tem cinco membros permanentes - Estados Unidos de América, Rússia, França, Reino Unido e China - e dez membros não-permanentes.


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