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Níger: Três países dispostos a intervir militarmente



Três países da CEDEAO confirmaram a disponibilidade para medidas militares contra o Níger se os militares golpistas não restabelecerem a legalidade constitucional. Junta Militar avisa que ripostará a qualquer agressao

Os três países - Senegal, Costa do Marfim e Nigéria - dizem aguardar a decisão dos chefes de Estado-Maior da CEDEAO, que iniciaram na quarta-feira (02.07) uma reunião extraordinária em Abuja (Nigéria) para discutir a situação no Níger, três dias antes do fim do ultimato dado pelo bloco regional aos golpistas para restabelecerem a legalidade constitucional.

Os vizinhos da África Ocidental ameaçaram usar a "força" se o Presidente Bazoum não for reintegrado até ao próximo domingo.

Embora os líderes da CEDEAO não tenham excluído a possibilidade de uma intervenção militar no Níger, afirmaram que essa seria "a última opção".

Paralelamente a esta reunião, uma delegação da CEDEAO - chefiada pelo antigo presidente nigerino Abdusalami Abubakar - deslocou-se ontem a Niamey para dialogar com os líderes golpistas.

No mesmo dia, uma delegação da junta militar deslocou-se ao Mali e, mais tarde, ao Burkina Faso - países governados por juntas militares que manifestaram o seu apoio militar aos golpistas do Níger - a fim de pôr em prática uma estratégia de luta e de apoio comum.

A Junta Militar que tomou o poder no Níger a 26 de julho avisou quinta-feira (03.07) que ripostará imediatamente a qualquer agressão da CEDEAO, denunciou os acordos militares assinados com França e afastou quatro embaixadores noutros tantos países.

Num comunicado transmitido pela televisão nacional na noite de quinta-feira, lido pelo coronel Amadou Abduramane, os golpistas, organizados no Conselho Nacional para a Salvaguarda da Pátria (CNSP), apelam à população para que esteja "vigilante" contra "espiões e forças armadas estrangeiras" e para que alerte as autoridades para quaisquer movimentos suspeitos.

Por outro lado, os golpistas denunciaram os vários acordos militares assinados com a França, nomeadamente no que diz respeito ao "estacionamento" do destacamento francês e ao "estatuto" dos soldados presentes no âmbito da luta contra o ‘jihadismo'.

"Perante a atitude e a reação leviana da França face à situação" no Níger, "o CNSP decidiu denunciar os acordos de cooperação no domínio da segurança e da defesa com aquele país", declararam os golpistas.

A Junta Militar anunciou também a "cessação" das "funções" dos embaixadores do Níger em França, nos Estados Unidos, na Nigéria e no Togo.

A delegação da CEDEAO, chefiada pelo antigo chefe de Estado nigeriano Abdulsalami Abubakar, deverá "encontrar-se com os líderes do golpe de Estado no Níger para apresentar as exigências dos líderes da CEDEAO", de acordo com um comunicado da presidência nigeriana.

O Presidente da Nigéria, Bola Tinubu, atual Presidente da CEDEAO, pediu-lhe que "fizesse tudo o que fosse possível" para uma "resolução amigável" da crise no Níger, na sequência das sanções impostas ao país e de um ultimato dado aos golpistas para restabelecerem a ordem constitucional, sob pena de recorrerem à "força".

Relações tensas entre junta militar e a CEDEAO

Numa entrevista à agência noticiosa France-Presse (AFP), o embaixador do Níger em Washington, Kiari Liman-Tinguiri, um dos afastados do cargo, pediu à Junta Militar para "ganhar juízo".

"Se o Níger entrar em colapso, todo o Sahel entrará em colapso e será desestabilizado [...] e teremos [o grupo de mercenários] Wagner e os ‘jihadistas' a controlar a África desde a costa até ao Mediterrâneo", advertiu Liman-Tinguri.

Por outro lado, o Mali e o Burkina Faso declararam que qualquer intervenção armada no Níger será considerada "como uma declaração de guerra" contra os dois países.

Se as relações entre Niamey e o bloco da África Ocidental são tensas, também o são com a França, a antiga potência colonial.

Na quinta-feira (03.07), os programas da RFI (Radio France Internationale) e do canal de notícias televisivo France 24 foram interrompidos no Níger, "uma decisão tomada fora de qualquer quadro convencional e legal", segundo a empresa-mãe dos dois meios de comunicação, France Médias Monde.

A suspensão das emissões ocorreu no dia do 63.º aniversário da independência do Níger.

Desde o golpe de Estado, as relações com Paris deterioraram-se. Os incidentes ocorridos no domingo, durante uma manifestação diante da embaixada francesa, levaram à evacuação de mais de 500 cidadãos franceses.

Milhares de manifestantes que apoiam a junta no poder saíram às ruas de várias cidades nigerianas na quinta-feira, numa manifestação pacífica convocada pelo M62, uma coligação de organizações "soberanistas" da sociedade civil.

Muitos deles entoaram slogans críticos em relação à França e agitaram bandeiras da Rússia - país do qual o Mali e o Burkina Faso já se aproximaram.

O acesso à embaixada francesa e a outras chancelarias próximas foi bloqueado na quinta-feira pelas forças de segurança nigerianas, observaram os jornalistas da AFP. 

Antes da manifestação, Paris tinha reiterado "que a segurança das instalações diplomáticas e do pessoal (eram) obrigações ao abrigo do direito internacional".

O Níger é um dos países mais pobres do mundo, apesar dos seus recursos de urânio. 

Bazoum avisa que todo o Sahel pode cair sob influência russa

O Presidente deposto do Níger, Mohamed Bazoum, detido desde a semana passada, alertou na quinta-feira que, caso a junta militar permaneça no poder, "toda a região pode cair sob a influência russa".

"Com um convite aberto dos conspiradores e dos seus aliados regionais, toda a região central do Sahel pode cair sob influência russa por meio do grupo Wagner, cujo terrorismo brutal foi claramente visto na Ucrânia", escreveu Bazoum.

Num artigo de opinião publicado no jornal norte-americano The Washington Post, o Presidente do Níger pediu a ajuda dos Estados Unidos e da comunidade internacional para "restaurar a ordem constitucional".

Bazoum, que sublinhou que escreve "como refém", denunciou que o Níger "está sob ataque de uma junta militar que tenta derrubar" a democracia do país. "Sou apenas um de centenas de cidadãos que foram presos arbitrariamente e ilegalmente", lamentou.

O líder deposto criticou o Mali e Burkina Faso, países vizinhos do Níger, por "apoiarem o golpe ilegal" e acusou-os de utilizar mercenários do grupo paramilitar russo Wagner "às custas da dignidade e dos direitos dos seus cidadãos".

O chefe de Estado defendeu o historial do seu Governo, deposto a 26 de julho, e garantiu que o país, assolado por ataques de grupos ligados ao Estado Islâmico e à Al-Qaida, estava mais seguro do que em qualquer outro momento nos últimos 15 anos.

Bazoum lembrou as sanções económicas impostas ao Níger pela Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental e disse que "essas medidas já mostram como seria um futuro sob uma junta autocrática sem viSão e sem aliados confiáveis".

Biden "libertação imediata"

"O preço do arroz subiu 40% entre domingo e terça-feira, e alguns bairros começaram a relatar escassez de produtos e eletricidade", lamentou o chefe de Estado do Níger, um dos países mais pobres do mundo.

Horas antes, o Presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, tinha apelado à "libertação imediata" de Bazoum e "à preservação da democracia duramente conquistada pelo Níger", numa declaração emitida no 63.º aniversário da independência do país da África Ocidental.

Os Estados Unidos ordenaram na quarta-feira a retirada do pessoal não essencial e reduziu ao mínimo as atividades da embaixada norte-americana em Niamey, na sequência do golpe de Estado, sublinhando que só pode intervir em situações de emergência.

Atualmente, os EUA têm cerca de 1.100 soldados no Níger dedicados a tarefas de antiterrorismo, vigilância e inteligência, em cooperação com as forças locais.

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